domingo, 26 de dezembro de 2010

Moriá

 


Subimos a encosta. Estava frio. O meu pai agarrava-me no braço numa mistura de "segue-me filho" com um "vem comigo".
"Para onde vamos?"
Viajávamos há três dias, já tinha feito esta pergunta mais vezes, e a resposta era sempre a mesma.
"Tenho de te mostrar uma coisa."
"O quê?"
"É... É surpresa."
O silêncio manteve-se enquanto subíamos a estrada de terra batida. O céu estava cinzento e nebuloso, ao fundo, mesmo por cima do monte havia uma espécie de janela vertical formada pelas nuvens. Sei que ela lá estava porque a luz do sol passava por lá e fazia uma espécie de holofote para o topo do monte.
"É para lá que vamos?"
"Sim."
Eventualmente, nesse dia, chegámos ao cume. Aí o meu pai olhou para o céu.
"Chegámos. Que queres que faça agora?"
Acenou com a cabeça.
"Com quem estás a falar?"
O meu pai olhou-me com uns olhos doentios, húmidos. Depois afastou-se um pouco, baixou-se e apanhou uma pedra. Agarrou-a e olhou-a por instantes. Brincou um bocado com ela. Levantou-se de costas para mim. Soltou o braço com que agarrava a pedra, como se perdesse a força, deixando-o cair. Olhou para cima. Virou-se para mim.
Houve um silêncio. E então, o meu pai gritou.
"Sim, eu Te obedeço. Sim, eu Te adoro."
"Pai?"
"Perdoa-me filho."
Não, não a atirou. Avançou contra mim com a pedra na mão, empunhando-a bem no alto enquanto gritava.

Sim, eu te adoro.



http://pt.wikipedia.org/wiki/Abra%C3%A3o#Deus_prova_a_f.C3.A9_de_Abra.C3.A3o

2 comentários:

  1. Não percebi o contexto, mas achei interessante :)

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  2. eheh
    Foi porque é Natal, e esta é uma história biblica, e o natal tem origem nesta história toda da religião. Escrevi este texto sem motivo nenhum, foi naquela! ;)

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